Educação

Para presidente do Inep, Enem 2018 errou ao colocar questão sobre homossexualidade

Alexandre Lopes garantiu que avaliação dos candidatos se dará de forma isenta e 'mais neutra possível', e acrescentou que objetivo do MEC não é discutir temas 'controversos'

Por Huffpost 20/10/2019 17h05
Para presidente do Inep, Enem 2018 errou ao colocar questão sobre homossexualidade
Aplicativo ajuda candidato a saber o local da prova do Enem 2018 - Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil/Agência Brasil

A análise dos candidatos do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) se dará de forma isenta. Foi o que afirmou o presidente do Inep (Instituto de Estudo e Pesquisas Educacionais), Alexandre Lopes, em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo deste domingo (20). ″Vamos avaliar o conhecimento do aluno, buscar uma prova mais neutra possível”. Lopes, porém, concordou com Jair Bolsonaro sobre o que ele chamou de ideologia de gênero e questões ligadas à homossexualidade no exame e deu a entender que, em 2019, o teste não tratará do assunto.

Para o comandante do Inep, “quando o então candidato e hoje presidente se manifesta, ele reverbera um incômodo de uma parcela da sociedade”. “O Inep errou na mão quando coloca uma questão que gera esse tipo de polêmica”, opina. Lopes acredita que, “se gerou desconforto, polêmica, está errado”. 

“Uma questão de prova que entra na dialética, na linguagem secreta de travesti, não tem nada a ver, não mede conhecimento nenhum. A não ser obrigar para que no futuro a garotada se interesse mais por esse assunto. Temos que fazer com que o Enem cobre conhecimentos úteis”, afirmou o mandatário em entrevista ao apresentador José Luiz Datena no Brasil Urgente, da Band em novembro passado. 

Polêmicas e temas controversos são importantes de discutir na sociedade, mas esse não é o objetivo do Enem ou do Ministério da Educação nas avaliações, pois há dubiedade. Avalia-se a opinião sobre o tema ou uma habilidade? Enem não é pesquisa de opinião.

A questão à qual Bolsonaro se referiu mostrou um texto sobre “pajubá, o dialeto secreto dos gays e travestis” e que questionava os motivos que faziam a linguagem se caracterizar como “elemento de patrimônio linguístico”.

Em março, o Inep, órgão ligado ao Ministério da Educação para cuidar do Enem, nomeou uma comissão que tinha como principal objetivo retirar da prova itens que abordassem supostas questões que tratassem de ideologia de gênero. O termo não é usado entre educadores. A portaria da criação do colegiado não informou os critérios utilizados para a análise. 

O colegiado teve um prazo para fazer um pente-fino no Banco Nacional de Itens (BNI), que é composto de milhares de questões.

Questionado pelo jornal se o item específico mencionado por Bolsonaro gerou polêmica justamente por tratar de uma temática, a homossexualidade, que parece proibida neste governo, Alexandre Lopes disse que o objetivo do MEC não é discutir temas “controversos” e que eles desviam do “foco”.

“A questão é a forma como aborda. Polêmicas e temas controversos são importantes de discutir na sociedade, mas esse não é o objetivo do Enem ou do Ministério da Educação nas avaliações, pois há dubiedade. Avalia-se a opinião sobre o tema ou uma habilidade? Enem não é pesquisa de opinião”, explicou à Folha.  

Em julho, o ministro Abraham Weitraub afirmou que “cabeças vão rodar” se existir “qualquer viés ideológico” na prova do Enem 2019.

“Foi passada uma orientação para todas as estruturas para acabar completamente com qualquer viés ideológico na elaboração de provas. Quem não performar adequadamente, a gente vai desligar. Não tem muita novidade”, disse em entrevista coletiva a jornalistas na ocasião.

De acordo com Weintraub, o objetivo do exame é dar aos alunos a “tranquilidade” de que eles só precisam estudar “ciência, matemática, ler e escrever corretamente, sem se preocupar com viés ideológico”.

O Inep errou na mão quando coloca uma questão que gera esse tipo de polêmica.

Enem no meio da polêmica

Lopes, formado em engenharia química e direito, é o terceiro presidente a ocupar o posto este ano. O cargo ficou cinco meses vago, mas ele garante que está tudo pronto para a prova, que será realizada nos dias 3 e 10 de novembro. A previsão é que o gabarito seja divulgado no dia 13.

Ele garantiu à Folha: “Eu não li, o ministro [Abraham Weintraub] não leu”. Ele já havia informado que o presidente Jair Bolsonaro também não havia lido o exame. E acrescentou: “Essa edição não tem muita diferença com relação às anteriores. A gente não fez as questões, tem um banco de itens e a gente trabalha nas questões que vão cair na prova. A área preparou e houve orientações para ter uma prova neutra.”

Destacou ainda que a banca de correção será isenta na correção e quem escrever, por exemplo, uma redação “de esquerda” ou “de direita” ele acha que não será prejudicado. “Disponibilizamos a cartilha de redação, e a gente não muda a regra. A banca de correção não é de servidores do Inep. Tem que saber argumentar e defender seu ponto de vista.”

O chefe do Inep deu ainda uma dica para os participantes: “O importante é que os jovens pensem na prova porque o resto a gente está cuidando para vocês. Façam a revisão, descansem, foca na prova, esquece política, confusão. Administrem seu emocional.”

E finalizou ao responder se o escritor Olavo de Carvalho, considerado mentor do presidente Jair Bolsonaro, pode cair na prova: “Quero dizer é que Olavo ou [Karl] Marx são temas que geram sensibilidade e podem tirar foco da questão. Se vai cair, não sei, não olhei. Pode cair tudo, desde que meça [conhecimento]. Mas se o texto for gerar polêmica, para quê?”.