Política

Rota de colisão: órgãos apoiam MP contra ALE e a extinção do Gaeco

Emendas em lei complementar aprovada por deputados esfacela órgãos colegiados do MP

Por 7Segundos com Assessorias 12/03/2020 12h12
Rota de colisão: órgãos apoiam MP contra ALE e a extinção do Gaeco
Sessão na Assembleia Legislativa do Estado (ALE) - Foto: Assessoria

Entidades classistas saíram em defesa do Ministério Público de Alagoas que está em pé de guerra com a Assembleia Legislativa desde a aprovação de emendas à Lei Orgânica do MPE, que extingue órgãos colegiados, entre eles os núcleos responsáveis pelo combate à corrupção e sonegação fiscal. A Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp) e os coordenadores dos Centros de Apoio e Grupos Especiais de Atuação de Defesa do Patrimônio do Ministério Público Brasileiro emitiram notas de repúdio alegando que as emendas são um ferem a autonomia do MP e que fragilizam a atuação do órgão no combate aos crimes de "colarinho branco".

A lei complementar nº73/2019, de autoria da Procuradoria Geral de Justiça foi aprovada pela Assembleia, com emendas apresentadas pelos parlamentares, na sessão ocorrida na quarta-feira (11). A matéria trata da Lei Orgânica do Ministério Público Estadual e conta com oito capítulos e 185 artigos. Entre as alterações, os parlamentares querem que os órgãos colegiados do MP sejam criados apenas após aprovação de lei específica na ALE.

Com isso, o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), o Grupo de Atuação Especial de Combate à Sonegação Fiscal (Gaesf), o Centro de Apoio Operacional das Promotorias (Caop), bem como todos os seus núcleos: defesa da criança e do adolescente, defesa da mulher, direitos humanos, meio ambiente, saúde pública, entre outros, seriam extintos até que projeto de lei específicos para cada um deles fosse aprovado pelos deputados.

Em nota (leia na íntegra ao final do texto), a Conamp  classifica como grave a tentativa de extinguir os órgãos e também de alterar os procedimentos para a escolha do chefe do Ministério Pùblico. "Atentam contra a autonomia do MP de Alagoas e a independência funcional de seus membros", descreve. Os coordenadores dos Centros de Apoio e Grupos Especiais de Atuação de Defesa do Patrimônio do Ministério Público Brasileiro sobrescreveram outro desagravo em que afirmam esperar que o governo estadual não sancione a lei complementar.

"Está claro que proposições dessa natureza têm o intuito de fragilizar a atuação ministerial, com a redução de suas frentes de trabalho e das impactantes ações de transformação social e combate à criminalidade de colarinho branco, bem como de desacelerar o processo de construção da identidade ética em andamento em todo o Brasil", declarou.

Na sessão em que os deputados estaduais aprovaram a lei complementar com emendas, vários parlamentares defenderam seu ponto de vista. Davi Maia (DEM) afirmou que "é uma mentira" que a aprovação da matéria levaria a extinção do Gaeco. "O que esta Casa fez foi afirmar que para qualquer instituição, seja Tribunal de Justiça, Tribunal de Contas ou Governo do Estado, que queira fazer alguma mudança no seu organograma interno, é necessário enviar um projeto de lei para a Assembleia Legislativa”, disse.

Para o deputado Bruno Toledo (PROS), a discussão sobre os órgãos colegiados não passa de "cortina de fumaça" e que o MP não teria ficado satisfeito com a emenda que corta bonificações. "A instituição merece todo meu respeito. Mas o tema é sensível já que trata do fim dos penduricalhos do Ministério Público e a legalização dos grupos de trabalho da instituição", ressaltou.

Após a repercussão, a Assembleia Legislativa também se manifestou, por meio de nota, falando sobre as emendas feitas à Lei Orgânica do MP. " O Parlamento, que observa o princípio da separação de poderes e o sistema de freios e contrapesos, repele a tentativa de desqualificar a prerrogativa do legislador. Lembra, por fim, da criação da 17ª Vara, de titularidade coletiva, cujo projeto de lei passou pelo crivo e aprovação do Poder Legislativo, que ofertou seu apoio ao fortalecimento da luta contra a criminalidade". O texto (leia, na íntegra, ao final da matéria) trata ainda das outras emendas como o veto a gratificações e bonificações, classificadas como "penduricalhos". 

Mesmo assim, por enquanto, o lado do Ministério Público está mais forte na batalha. Ainda na quarta-feira (11), o procurador-geral de justiça em exercício, Márcio Roberto Tenório de Albuquerque, junto com representantes da Ampal, Sindicato dos Servidores do MP e do Colégio dos Procuradores de Justiça tiveram uma audiência com Renan Calheiros Filho (MDB) para pedir ao governador que não sancione a lei complementar como ela foi aprovada pela Assembleia. Horas depois, em uma entrevista à imprensa, afirmou que poderá vetar as emendas aprovadas.

"Recebo a recomendação do MP com a sensação de que esse deve ser o caminho a seguir", declarou, dizendo também que está "integralmente de acordo" com o Ministério Público em relação à importância do Gaeco e Gaesf para o Estado.

NOTA DA CONAMP

A ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO (CONAMP), entidade que representa mais de 16 mil Membros do Ministério Público, vem a público manifestar preocupação e firmar posição contrária às emendas parlamentares aprovadas pela Assembleia Legislativa de Alagoas, que desfiguram Projeto de Lei Complementar apresentado pelo ProcuradorGeral de Justiça, e que representam, na prática, proposições legislativas autônomas em matérias de iniciativa do Chefe do Parquet.

Não se desconhece a relevância dos parlamentos para, em uma democracia representativa, editar as normas primárias que regem a vida em sociedade. No entanto, como todos os poderes constituídos, o Legislativo deve atuar em estrita conformidade com a Constituição, dotada de reconhecida supremacia em nossa ordem jurídica.

Nesse contexto, a Carta Cidadã de 1988 erigiu o Ministério Público a instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da juridicidade, da democracia e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.

Desse modo, atentam contra a autonomia do MP de Alagoas e a independência funcional de seus membros, e, ademais, contra o interesse da sociedade, propostas que visam extinguir órgãos de coordenação e grupos de atuação, a exemplo do GAECO, que, naquele Estado, e em todo o país, tem exercido um papel fundamental no enfrentamento ao crime organizado e à corrupção.

Igualmente grave é a tentativa de alterar radicalmente os procedimentos de escolha e de destituição do Chefe do Parquet Alagoano, já disciplinados na Constituição Federal e na Lei Orgânica Nacional (Lei Federal nº 8.625/1993), verdadeiras garantias institucionais, indispensáveis a uma atuação livre, isenta e independente do órgão, em benefício de toda a sociedade.

Nesse particular, o STF vem reconhecendo as inconstitucionalidades formal e material de alterações legislativas que, em descompasso com o princípio democrático, restrinjam a capacidade eleitoral passiva dos membros do Ministério Público, Promotores e Procuradores de Justiça, para concorrer à formação de lista tríplice, no processo de escolha do Procurador-Geral.

Por todas essas razões, a CONAMP espera que, a partir do diálogo já aberto pela Associação do Ministério Público de Alagoas (AMPAL) e pelo ProcuradorGeral de Justiça, o Excelentíssimo Senhor Governador do Estado vete o texto aprovado pela Assembleia Legislativa, antecipando que adotará todas as medidas necessárias à preservação da autonomia do Parquet de Alagoas e da independência de seus integrantes.

Brasília, 11 de março de 2020. Victor Hugo Palmeiro de Azevedo Neto, Presidente da CONAMP

 

NOTA DE APOIO AO MINISTÉRIO PUBLICO DE ALAGOAS

Os Coordenadores dos Centros de Apoio e Grupos Especiais de Atuação de Defesa do Patrimônio Público do Ministério Público Brasileiro, abaixo subscritos, tendo por fundamento os arts 1°, parágrafo único; 3°, I e 127, da Constituição Federal e os princípios da moralidade, eficiência, vedação ao retrocesso e supremacia do interesse público, manifestam o seu total apoio ao MP de Alagoas e repudiam veementemente a todo e qualquer abuso da atividade legislativa, em especial, as inovações inseridas no Projeto de Lei Complementar nº 73/19, de alterações à Lei Orgânica do MPAL (nº 15/96), que prevêem a extinção de órgãos com destacada atuação no combate à corrupção e de defesa ao erário, essenciais ao fomento de uma atuação especializada e efetiva na defesa dos interesses da sociedade, como os Centros de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça (CAOPs), o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado e o Grupo de Atuação Especial em Sonegação Fiscal e Lavagem de Bens.

Está claro que proposições dessa natureza têm o intuito de fragilizar a atuação ministerial, com a redução de suas frentes de trabalho e das impactantes ações de transformação social e combate à criminalidade de colarinho branco, bem como de desacelerar o processo de construção da identidade ética em andamento em todo o Brasil.

Além disso, depreciam os poderes constituídos, desvalorizam a nobre e relevantíssima função legislativa, ao tempo em que traem os princípios democráticos sobre os quais exercem-se os mandatos eletivos, em aparente retaliação às ações bem sucedidas do Ministério Público na defesa do erário de Alagoas.

Aguarda-se que o Poder Executivo não coadune com tamanho desrespeito e desvirtuamento da missão de promoção da vontade popular e assegure o bem comum.

Espera-se que as proposições desestruturantes recém editadas pela Casa Legislativa Alagoana sejam, de pronto, vetadas pelo Excelentíssimo Senhor Governador do Estado, elevando-se a atuação do Ministério Público de Alagoas, preservando-se seus instrumentos de defesa da sociedade, com consequente aprovação do texto original do projeto e afastamento das inserções contrárias ao estado democrático de direito.

 

Em Nota, Legislativo aponta o caminho da formulação de lei para fixação de subsídios e criação de órgãos colegiados

 

É importante expor o que ainda não foi dito aos alagoanos a respeito das legítimas emendas parlamentares ao Projeto de Lei Complementar 73/19, que altera a Lei Orgânica do Ministério Público de Alagoas. Neste sentido, segue a verdade:

1. O Projeto instituía auxílio saúde e auxílio alimentação no limite de 5% do subsídio, mais adicional por atuação funcional suplementar em mutirões no patamar de 2% do subsídio, além de adicional de 1% por atuação funcional suplementar em plantões e adicional de 7% por difícil provimento.

2. O Ministério Público, como fiscal da lei, deveria observar o texto constitucional e respeitar o livre funcionamento do Poder Legislativo, bem como a ação legítima de seu colegiado. A Carta Magna, que consagra aos integrantes do MP generosa remuneração, exclusiva e por subsídio fixado em parcela única, vedou também o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, conhecidos como penduricalhos.

3. Até agora não foi dito que o mencionado Projeto propunha a equiparação com os magistrados, apesar de a Constituição Federal impedir a vinculação ou equiparação de quaisquer espécies remuneratórias para efeito de remuneração de pessoal do serviço público.

4. Por enquanto, pelas redes sociais, vozes isoladas externam irresignação em torno da postura do Parlamento de perceber a impossibilidade de manter órgãos colegiados executivos, em razão de ofensa à figura do promotor natural e de constitucionalidade extremamente duvidosa.

5. Além disso, as mesmas vozes externam inconformismo pelo impedimento aos promotores de justiça de acessarem ao cargo de Procurador Geral de Justiça, tal como já ocorrem em São Paulo e outros Estados da Federação.

6. O Parlamento, que observa o princípio da separação de poderes e o sistema de freios e contrapesos, repele a tentativa de desqualificar a prerrogativa do legislador. Lembra, por fim, da criação da 17ª Vara, de titularidade coletiva, cujo projeto de lei passou pelo crivo e aprovação do Poder Legislativo, que ofertou seu apoio ao fortalecimento da luta contra a criminalidade.

O Poder Legislativo reafirma suas prerrogativas constitucionais de legislar, fiscalizar e representar os interesses do povo. Neste sentido, corrige distorções e aponta o caminho da formulação de lei para fixação de subsídios e criação de órgãos colegiados. Por fim, reitera o compromisso em defesa das instituições, tendo o diálogo permanente como caminho para a harmonia e o desenvolvimento.